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Prefeituras e Tesouro vivem impasse sobre padrões de dados fiscais

Prefeituras e Tesouro vivem impasse sobre padrões de dados fiscais

O Tesouro Nacional e as prefeituras estão em meio a uma disputa em torno da implantação completa do sistema padronizado de fornecimento de dados das contas municipais ao Tesouro Nacional. A chamada "Matriz de Saldos Contábeis" (MSC) vem sendo implementada desde 2017 e é base técnica para o governo tentar reverter a prática disseminada de maquiagem nas contas de Estados e municípios.

 

A última etapa desse processo de implantação estava prevista para entrar em vigor em janeiro, foi adiada para o início de agosto, mas muitos prefeitos, por meio da Confederação Nacional de Municípios (CNM), têm reclamado da dificuldade de fornecer esses dados. Atualmente, cerca de mil prefeituras estão entregando ao Tesouro os dados no formato da Matriz, ou seja, menos de um quinto dos 5.570 municípios do país.

 

A partir de agosto, o município que não o fizer estará sujeito às punições previstas em lei, basicamente ficará impedido de receber transferências voluntárias da União ou não terá autorização para fazer operação de crédito.

 

O presidente da CNM, Glademir Aroldi, disse ao Valor que considera a Matriz do Tesouro uma iniciativa importante, mas os municípios têm dificuldades de implantar a medida por causa de custos, envolvendo tecnologia e treinamento de pessoal.

 

Ele defende que o ideal era que o Tesouro fizesse acordo com os tribunais de contas estaduais e municipais para que esses entes inserissem suas informações fiscais na MSC, evitando a necessidade de dupla informação. É o que acontece hoje no Espírito Santo.

 

"Cada tribunal tem seus sistemas e ferramentas, e os municípios precisam se adequar a isso", disse. "O que preocupa a gente é que, no fim de julho, por conta disso, muitos municípios estarão incluídos no Cauc [Cadastro Único de Convênios] sem poder receber recursos", disse o representante municipalista, destacando que as prefeituras ainda têm que atender outros sistemas, como os dos ministérios da Saúde e Educação.

 

A subsecretária de Contabilidade Pública do Tesouro, Gildenora Milhomem, explicou ao Valor que há uma interpretação equivocada de que a Matriz de Saldos Contábeis exige a implantação de novo sistema. O modelo é uma planilha simples, semelhante a um arquivo do Excel, cujo formato foi desenhado pelo Tesouro e no qual devem ser inseridos os dados brutos da contabilidade dos municípios. Uma vez enviados os dados ao Tesouro, esse gera relatórios que as prefeituras podem validar e alterar conforme as regras definidas em seus tribunais de contas.

 

Para efeitos de cumprimento da norma, argumenta, o Tesouro exige apenas o envio dos dados, não questiona os posteriores relatórios feitos com os números, como os polêmicos gastos com pessoal, cuja forma de contabilização tem diferentes interpretações nos tribunais de contas.

 

A área técnica do Tesouro reconhece que para algumas prefeituras há dificuldade de preencher a matriz porque elas têm problemas gerenciais em suas contabilidades, descumprindo legislações de 1960 e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), além de normativos mais recentes, como um decreto de 2010. Mas esse problema não está relacionado à MSC, e sim a problemas contábeis que precisam ser sanados, no entendimento do Tesouro. A visão é que, se o ente tem uma contabilidade minimamente estruturada, não há qualquer dificuldade para se obedecer à matriz, que é só uma plataforma para se colocar dados brutos.

 

Gildenora considera boa a ideia da CNM de se promover a matriz por meio dos tribunais de contas e destaca que esse tipo de convênio está em discussão com esses órgãos, dada a bem-sucedida experiência com o Espírito Santo. Mas, ainda assim, aponta que não pretende alterar o prazo para que os municípios passem a fornecer os dados diretamente ao Tesouro.

 

O coordenador-geral do Departamento de Contabilidade do Tesouro, Leonardo Nascimento, acrescenta que, na prática, a MSC deve reduzir custos para as prefeituras. Isso porque, com os dados brutos, o Tesouro poderá produzir relatórios que antes elas teriam que fazer, e bastará aos entes fazer seus ajustes conforme as normas locais. Além disso, a ideia é integrar os sistemas com os ministérios da Saúde e Educação, reduzindo esse custo para as prefeituras.

 

Em breve, o governo deve enviar ao Congresso o chamado Plano Mansueto, que visa a socorrer os Estados em dificuldade, mas em situação não falimentar. Nesse caso, haverá exigência de cumprimento dos critérios do Tesouro para contabilização de gastos com pessoal. E a Matriz de Saldos Contábeis facilitará o cumprimento dessa obrigação, na visão do Tesouro.

 

Fonte: https://www.valor.com.br/brasil/6256017/prefeituras-e-tesouro-vivem-impasse-sobre-padroes-de-dados-fiscais